O (des)encontro em "Sinal Fechado" de Paulinho da Viola e Chico Buarque.

Olá galera! 

A música de hoje do nosso Quarta Musical se chama "Sinal Fechado". Essa canção foi composta por Paulinho da Viola no ano de 1969 e gravada por Chico Buarque em 1974, no ápice da censura, um instrumento forte de repressão usado durante a Ditadura Militar no Brasil. Chico foi o artista mais censurado durante esse período, fazendo com que este apelasse para a sua própria criatividade, lançando o pseudônimo Julinho da Adelaide, com o intuito de driblar a proibição de suas composições. 

A música também virou tema de um livro escrito por Alberto Moby, cujo o título é: "Sinal fechado: a Música Popular Brasileira Sob Censura (1937-45/1969-78)", lançado em 1994 e sua segunda edição em 2008. A obra oferece ao leitor um passeio pela nossa história, que ficou marcada com a Ditadura Militar e a expressão da MPB durante esse período. 

"Sinal Fechado" também participou do Quinto Festival de Música da Record, em 1969, sendo considerada o "último suspiro da MPB". Trazendo uma letra que traz um descontentamento com a realidade dessa época, pois as outras músicas participantes já não vinham mais com críticas explícitas ao regime militar. 

O compositor, cantor e sambista Paulinho da Viola, escreveu uma letra empírica e sem dúvida, bastante atual. Embora pareça somente uma conversa entre duas pessoas que não se veem com frequência, existe ali uma crítica profunda, baseada em uma mordaça na comunicação, presente no período do AI-5, decretado no Governo Geisel. A dificuldade em manter um diálogo, o impedimento de dizer o que sente, ruas vazias e a vontade imensa de querer sumir de todo aquele tormento, são retratos de um período complicado que vivemos durante a década de 70. 


Nos dias de hoje, essa tensão, frieza e o acanhamento presente no diálogo entre os dois personagens da canção, são decorrentes de toda a correria do dia a dia e a rapidez do avanço tecnológico, fazendo com que a gente disponibilize de pouco tempo ao encontro presencial com amigos, ficando este cada vez mais virtual.  E esses desencontros estão ocorrendo muito devido às pressas de todos por se chegar a um lugar no futuro.  Podemos relacionar também ao momento atual, o fato de as pessoas terem dificuldades de obter um entendimento por conta das discordâncias existentes em relação à política, principalmente, fazendo com que muitas amizades se percam no caminho. Em um ritmo rápido, a melodia nos traz um clima pesado, de ansiedade em querer falar e não conseguir, por não encontrar as palavras certas, pois o sinal encontra-se fechado até mesmo para o diálogo. 

Uma canção que se observarmos bem, faz muito mais sentido agora do que na época em que foi escrita. A vida urbana acelerada, muitos veículos e sinais fechados, as conversas rápidas através das janelas dos carros e aquele famoso "Vamos marcar qualquer dia desses?", muito presente nas falas dos brasileiros. E quase na maioria das vezes, não se marca nada, embora muitos realmente quisessem.  Não há encontro de fato, somente ficam a espera de uma nova oportunidade, de se esbarrarem em um próximo sinal 
vermelho. 


Vamos então à letra: 

Olá, como vai?

Eu vou indo, e você, tudo bem?

Tudo bem, eu vou indo correndo

Pegar meu lugar no futuro, e você?

Tudo bem, eu vou indo em busca

De um sono tranquilo, quem sabe?

Quanto tempo, pois é, quanto tempo

O momento em que você encontra uma pessoa (des)conhecida  ou um velho amigo (a) no meio de um trânsito, parado em um sinal fechado. O diálogo começa com o básico cumprimento inicial e em seguida dizem que estão apressados. Um na correria do trabalho, a pressa de conseguir alcançar um lugar no futuro e outro fala da necessidade de ter um sono tranquilo, sem preocupações e estresses, conseguir relaxar e descansar de fato, depois de um dia agitado. 

E aí um deles percebe que em menos de 1 minuto a conversa, que em sua mente parecia que tinha levado horas, já tinha chegado ao fim e não sabendo o que dizer, fala: "Quanto tempo, pois é, quanto tempo".  Após esse momento, o autor coloca um silêncio desconfortante na canção e ela simplesmente para, como se a conversa realmente tivesse acabado. Até que um deles resolve falar e o momento de tensão retorna: 

Me perdoe a pressa

É a alma dos nossos negócios

Pô, não tem de quê

Eu também só ando a cem

A pressa novamente. Os dois começam a colocar desculpas para justificarem a ausência e a falta de tempo por conta do trabalho. E pra dar uma quebrada no clima tenso, um deles procura compreender o outro ao dizer: "Pô, não tem de quê", como forma de dizer: "Não se preocupe, eu também só ando apressado." 

A todo momento percebemos o ritmo acelerado do diálogo, provocado pela melodia, causando até mesmo uma angústia em quem ouve a canção. 


Quando é que você telefona?

Precisamos nos ver por aí

Pra semana, prometo

Talvez nos vejamos, quem sabe?

Quanto tempo, pois é, quanto tempo

A ansiedade em querer continuar o papo num outro momento mais tranquilo. "Quando é que você telefona?", um deles pergunta, pois diz que precisam se ver. O outro deixa uma dúvida no ar se realmente esse encontro irá acontecer, terminando a fala com um "quem sabe?"

Mais uma vez o assunto termina e novamente um deles fala: "Quanto tempo, pois é, quanto tempo" e volta o silêncio e a pausa em seguida, nos dando uma ligeira impressão que de fato o encontro pode não  acontecer. 


Tanto coisa que eu tinha a dizer

Mas eu sumi na poeira das ruas

Eu também tenho algo a dizer

Mas me foge à lembrança

Essa parte confirma o tempo em que não se veem. Tanto tempo longe um do outro que nem se lembram mais o que vão dizer. 


Por favor, telefone, eu preciso beber

Alguma coisa rapidamente

Pra semana, o sinal

Eu procuro você, vai abrir, vai abrir

Prometo, não esqueço

Por favor não esqueça, não esqueça

Não esqueço, adeus, adeus.

Nesse momento um deles tenta uma aproximação de verdade, convidando o outro para uma bebida e fala da necessidade de ser urgente. E o outro promete que vai procurá-lo. 

O sinal está prestes a abrir e aquele papo está na hora de acabar. 

Conforme vai chegando ao fim, a música começa a ficar mais rápida, num ritmo acelerado e na esperança do sinal abrir logo e aquela conversa angustiante chegar ao fim. 

Enfim, eles terminam dizendo adeus um para o outro, podendo significar que nunca mais se encontrarão. 

Abaixo colocamos diversas gravações maravilhosas de "Sinal Fechado" pra vocês curtirem: 


Paulinho da Viola



Chico Buarque



Chico Buarque e Maria Bethânia



Elis Regina



Fagner



Marisa Monte e Paulinho da Viola



Oswaldo Montenegro


Que a gente possa marcar e comparecer mais vezes. 
Até a próxima!

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Texto: Priscilla Dutra
Edição: Nanda Catarcione

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